Depois do affair Miller, que escandalizou Paris com a publicação de Sexus, Henry Miller prosseguiu a sua Trilogia da Rosa-Crucificação com este Plexus, originalmente editado em 1953.
A relação obsessiva com Mona, que já atravessara o primeiro volume, coloca agora o narrador a braços com a sobrevivência diária, depois de desistir de um emprego estável numa companhia telegráfica para se dedicar à escrita. Ao sexo, às bebedeiras e às deambulações filosóficas sem outro método que não o ir andando junta-se a necessidade de arranjar dinheiro e a persistência de escrever e publicar. Miller negou sempre o carácter autobiográfico desta trilogia, e em benefício de uma leitura baseada apenas no texto e não nos factóides que o envolvem, essa é a postura mais indicada, mesmo que não seja difícil encontrar ecos da vida do autor nesta catadupa torrencial e desordenada de personagens alucinadas, noites de copos com final imprevisível e desejos mais ou menos concretizados (com mais ou menos acrobacias circenses pelo meio). A alternativa de ler Plexus, bem como os outros dois volumes da trilogia, como uma descrição da vida do autor pode ser tentadora do ponto de vista da bisbilhotice mas retira à leitura a sua maior dádiva: a queda, sem rede, dentro de uma narrativa labiríntica, povoada pelas personagens mais improváveis e desarticuladas e ritmada pelos impulsos e pela urgência de os satisfazer.
Crítica de Sara Figueiredo Costa, a Plexus, de Henry Miller, publicada na Time Out Lisboa, no dia 3 de Fevereiro.
PLEXUS é o romance central da trilogia “Rosa-Crucificação”, iniciada com SEXUS. Relato ficcionado da frenética e extraordinária vida de Henry Miller com a sua sensual segunda mulher, Mona, em Nova Iorque, é um testemunho da caótica metamorfose do autor e do seu absoluto amor pela vida.
Encorajado por Mona e ansioso por se dedicar à escrita, Henry Miller abandona o seu emprego estável na Companhia Telegráfica Cosmodemónica. O quotidiano transforma-se então numa inglória mas sempre criativa luta pela sobrevivência, em que ambos são desesperadamente pobres e absurdamente felizes. Nos seus relatos de uma vida simultaneamente sublime e miserável, PLEXUS é, acima de tudo, uma história de amor – o amor incondicional e obsessivo que Miller sente por Mona, apesar dos seus defeitos; pela vida, apesar dos seus muitos reveses; e pela língua inglesa.
Publicado originalmente em Paris em 1953 e proibido nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha durante quase quinze anos, PLEXUS é uma erótica celebração de uma vida dissoluta.
Henry Miller nasceu em Dezembro de 1891, em Brooklyn,
Em 1930, Henry Miller foi viver para Paris. Durante os dez anos seguintes, misturou-se com os expatriados empobrecidos e os parisienses boémios, entre eles Brassaï, Artaud e Anaïs Nin, com quem manteve uma relação bastante documentada. O seu primeiro livro publicado, Trópico de Câncer, foi editado pela Oblisk Press
Henry Miller regressou aos Estados Unidos em 1940, estabelecendo-se
Henry Miller morreu a 7 de Junho de 1980,
A par de Sexus e Plexus, no catálogo ASA figuram também as obras O Sorriso aos Pés da Escada e Moloch ou Este Mundo Pagão.
Realizado por Phlip Kaufman em 1990, Henry e June retrata o início a relação entre Henry Miller e Anaïs Nim, quando o autor de Sexus se muda para Paris. O filme conta com Maria de Medeiros, Fred Ward, Uma Thurman e Kevin Spacey nos principais papéis.
Se o conceito está na moda para tudo, por que não haveria de estar também para os livros? É o argumento para se reunirem estes três livros – com mais a caminho – sob o mesmo “tecto”: uma Colecção Vintage. O grafismo das capas pisca discretamente o olho ao conceito, mas não é esse o objectivo principal a reter. Aqui, é à intenção que se deve dar valor. Porque no fundo trata-se apenas de um bom motivo para dar nova vida a obras fundamentais de uma selecção cuidadosa de escritores conceituados. Se já temos Sexus – o ponto inaugural da fundamental trilogia Rosa-Crucificação –, O Livro do Riso e do Esquecimento – pano de fundo para toda uma obra de casamento entre humor e reflexão filosófica – e A Terceira Condição – o pulsar mais claro de uma voz que tem tanto de literária como de histórica –, não precisamos de pedir muito mais para que os ventos da moda vintage tenham sido bem aproveitados.
"Podíamos vê-lo a deambular, nos anos 30, nas ruas de Paris, cheio de fome. Fome de comida, fome de escrita, fome de leitura e, inevitavelmente, fome de sexo..."
Leia o resto da crítica de Filipa Melo, no Sol, a Sexus, de Henry Miller, aqui.
"Há livros que provocam um tal alarido fora das suas páginas que só quando o silêncio regressa são devidamente apreciados..."
Leia a continuação da crítica de Sara Figueiredo Costa, na Time Out, a Sexus, de Henry Miller, no blogue Cadeirão Voltaire.
Pianista, coveiro, bibliotecário, pugilista… estes foram, entre outros, alguns dos ofícios do inquieto Henry Miller. Filho de um modesto alfaiate nova-iorquino, cresceu nas ruas de Brooklyn, cenário inicial de uma vida que ele próprio descrevia como sendo “mais real e mais importante do que tudo o que pudesse inventar”. Desconcertantemente sincero, crítico e inconformista, abandonou a América com destino a Paris, na década de 1930, para levar uma vida literária boémia. Miller chamaria a esta morte da sua antiga existência e ressurreição como escritor a “Rosa-Crucificação”. Esta dramática transformação forneceu o leitmotiv para alguma da sua melhor escrita, corporizando tudo o que ele sentia acerca da autolibertação e da verdadeira vida do espírito.
SEXUS, o livro primeiro da trilogia “Rosa-Crucificação”, recorda, de forma ficcionada, a vida americana de Miller nos anos 20, quando, numa busca frenética por antídotos para o seu emprego monótono e a vida num “bairro morbidamente respeitável” com a sua mulher Maude, alimentou uma obsessão pela misteriosa e promíscua Mara.
Publicado originalmente em Paris em 1949, este picaresco e extraordinariamente sincero relato das escapadelas sexuais de Miller esteve proibido nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha durante quase vinte anos.
Henry Miller levou mais de dez anos a completar a trilogia da “Rosa-Crucificação”, que iniciou em 1949 com Sexus – uma obra tão controversa que pôs Paris em grande alvoroço com o “affair Miller” (e que fez com que o seu editor fosse ameaçado com a prisão) – e a que se seguiu Plexus (1953) e, por fim, Nexus (1959). Estas três obras são uma deslumbrante exibição de instantâneos do quotidiano, sexo e ideias. Dos últimos dias de Miller
“A ausência de boas maneiras, inibições e de limitações morais com que Miller descreve as várias personagens, confere uma grande vitalidade a Sexus. Miller não consegue ser pomposo – uma rara virtude – e a sua honestidade é total.”
The Spectator
“A obra-prima de Henry Miller.”
Choice
“A literatura americana começa e acaba com o sentido do que Henry Miller fez.”
Lawrence Durrell
Deve ter sido numa quinta-feira à noite que a vi pela primeira vez no salão de dança. Apresentei-me ao trabalho de manhã, como um sonâmbulo, depois de ter dormido uma hora ou duas. O dia passou como um sonho. Depois de jantar, adormeci no sofá e acordei pelas seis da manhã, completamente vestido. Sentia-me completamente fresco, com o coração limpo e obcecado com uma ideia: tê-la a qualquer preço. Ao caminhar pelo parque, pensei em que tipo de flores devia mandar com o livro que lhe tinha prometido (Winesburg, Ohio). Estava a chegar ao meu trigésimo terceiro ano, a idade de Cristo crucificado. Tinha uma vida nova pela frente, tivesse eu a coragem de arriscar tudo. Na verdade não havia nada a arriscar: estava no fundo do poço, um falhanço em todos os sentidos.
Era sábado de manhã, e para mim o sábado sempre foi o melhor dia da semana. Animo-me quando os outros estão a cair de cansaço; a minha semana começa com o dia de descanso judaico. Aquela ia ser a melhor semana da minha vida e viria a durar sete longos anos, mas é claro que não fazia ideia. Sabia apenas que o dia era auspicioso e prometia agitação. Dar o passo fatal, atirar tudo para trás, já é em si uma emancipação; nunca me passou pela cabeça quais seriam as consequências. Rendermo-nos absoluta e incondicionalmente à mulher que amamos é quebrar todas as amarras, excepto o desejo de não a perder, que é a mais terrível amarra de todas.
o livro do riso e do esquecimento